O ELEVADOR
De Junior Dalberto.
É quase meia-noite e Rafael - um jovem designer de uma famosa empresa
publicitária potiguar - caminha apressado pelo corredor do vigésimo oitavo
andar do edifício “Antáres”, em Petrópolis, bairro onde esta localizada a
empresa na qual trabalha. O seu pensamento corre mais rápido que suas passadas;
seu paladar já sente o sabor da cerveja bem gelada que costuma tomar no
Bardallos, todas as quintas-feiras, antes de voltar para casa. O Bardallos fica
no centro da cidade e é bastante frequentado por todos os tipos da fauna
intelectual de Natal, além de pseudointelectuais, artistas com talento e
desprovidos de talento, agregadores, solitários e bêbados an passant.
Para Rafael o Bardallos é um lugar onde ele se diverte com o estranho
humor do barman Ricardo e a picardia
do proprietário Lula Belmont, produtor cultural, que está sempre com seus enormes
olhos perscrutando tudo e muitas vezes dividindo gargalhadas com seus clientes
habituês. Se o cineasta espanhol Almodóvar, um dia, apontasse por lá e, observando
os notívagos com sua ótica tão peculiar, provasse sua gastronomia juntamente
com sua geladíssima cerveja, certamente se entusiasmaria e, com certeza, daria
asas a sua imaginação produzindo uma inspirada película.
Ainda no prédio, Rafael vai caminhando pelo corredor e, à sua
passagem, as luzes vão apagando-se automaticamente.
– Milagres dos sensores. Pensa o
rapaz.
Pára no final do corredor. Três enormes elevadores encontram-se à sua
frente e, como sempre, dois estão parados, pois já passam das vinte e duas
horas e existe contenção de despesas nesse edifício empresarial. O elevador do
centro conserva acesa a luzinha amarela mostrando que se encontra no quarto
andar. Rafael, impaciente, olha para os lados, aperta o botão de chamado do
elevador e revira os bolsos do terno até encontrar o que procura: uma carteira
de cigarros. Tira um do maço com a mão
esquerda, leva-o aos lábios e, em seguida, com a mesma mão, apanha o isqueiro.
Antes de acendê-lo as gigantescas portas metálicas do elevador se abrem.
Entra no elevador, coloca as mãos nos bolsos e olha para a câmera
filmadora que está disfarçada dentro de um pequenino ponto, no alto do canto
esquerdo, acima de um adesivo com o sinal de Proibido Fumar - o tradicional
cigarro dentro de um circulo cortado por um traço vermelho. O rapaz moreno
claro, magro, bonito, lábios finos e com olhos tão negros quanto o seu cabelo
cortado à máquina, rente a pele, do alto de seu 1,80m dá uma risadinha e solta
um palavrão, mas, continua conservando o cigarro entre os lábios. O elevador
fecha as portas, suavemente, quase sem barulho. O edifício havia sido
inaugurado há pouco tempo, portanto, tudo dentro dele era novo, cheirava a novo
e tudo estava funcionando perfeitamente.
RAFAEL: (Falando pra si mesmo) – Nem acredito que está vazio! Mas já é quase meia-noite e acho que
além do besta aqui só deve estar o japonês Yang na portaria e dormindo a sono
solto. Isso é bom, pois vou lhe fazer um susto daqueles. (Gritando) - Abre o
olho japonês! Kkkkkkk. Sei que não é
politicamente correto, mas bobagem, perde o amigo, mas não a piada. (olhando
para o relógio) – Ainda bem que esse
bairro é tranquilo e essa cidade mais ainda. Jesus, sempre que vejo essa câmera
dá uma vontade de cantar e dançar e, normalmente, é sacanagem. (Cantando e
rebolando) – "Ai se eu te
pego, ai se te pego". (Ainda falando para si mesmo) – Só quer ser o Teló. Se continuar com essa
frescura toda vai terminar queimando a ruela. Sai para longe pensamento
nojento. Deus me livre, daqui só sai. Pronto, agora vem aquele pensamento
nojento do exame de próstata; sempre que estou brincando vem essa droga de
pensamento... Acho que sou meio bipolar; estou sempre me sacaneando, que droga!
Quem deve ter inventado esse exame foi a porra de um médico viado ou um viado
médico. Só pode ser! Droga, meter o dedo no rabo dos outros, um troço
fedorento, feio, cabeludo, sempre cheio de bactérias, sei não, sei não!
(O elevador dá um solavanco) – Saravá!!! Eita, que droga é essa? Está parecendo o velho “Varandas Pôr
do Sol”. Isso lá é nome de edifício! É o prédio onde moro que, volta e meia,
quebra o elevador. Só falta, agora, as portas se abrirem pela metade e do outro
lado aparecer a careca lustrada do imbecil do meu síndico Genival. O energúmeno
só quer saber de grana, parece até político ou religioso. É dinheiro para o São
João do condomínio, para a reforma de piscina que nunca termina, aliás, nunca
pisei naquela bosta... Descobri, semana passada, que tem sauna no prédio. Está
bem próximo das festas do natal e ele deve vir por ai com a tal da droga da
festa de confraternização que só quem frequenta é ele com a família e meia
dúzia de velhos esquecidos pelo tempo e pela própria família. Ô prédio de
merda! Vou fazer um esforço e me mudar daquela joça.
(O elevador treme bastante e pára. As luzes acendem e apagam e depois
voltam a acender). – Droga, puta que
pariu! Que merda é essa? Está parado, que droga! E o fresco do japonês não está
vendo isso pelas câmeras? Tá droga nenhuma! Deve está é dormindo e eu aqui me lascando...
Acorda ô vagabundo filho de uma égua de olho puxado... Acorda e vê se libera
essa merda aqui.
(E continuando falando para si mesmo) – Calma, Rafael! Calma! Lembre-se que você foi
escoteiro... Calma e sempre alerta; em algum momento ele voltará a funcionar.
Tem gerador não, nessa joça? Se paga um condomínio pelos olhos da cara e será
que nem gerador tem? Deve ter... É moderno demais. Pânico não! (respira e
inspira) Puta que pariu! Isso lá é hora de pensar em pânico? Porque será que
esses pensamentos idiotas só vêm a nossa cabeça nas piores horas? Droga, droga,
droga... Não vou pensar nisso. Bunda, beijo na boca, bunda, beijo na boca, no
poço, quem me tira? Bobagens, quanta besteira. Doce de jaca... Adoro doce de
jaca... Talvez, assim, meu pensamento possa levar essa merda de pânico para
longe. Respira... Inspira... Respira... Inspira... Isso! Faz como a terapeuta
ensinou... Isso! Respiração de bebê. Droga, não ta adiantando! (Batendo nas
paredes do elevador) Abre essa porra, Yang! Japonês filho da puta! Porteiro
imbecil! Abre essa droga! Tem gente aqui... Estou sufocando, sufocando. Meu deus,
eu preciso me acalmar! Fica girando no mesmo lugar nervosamente de braços
abertos, depois começa a andar em círculos pelo elevador – Um, dois, um, dois, um, dois, três, quatro, um,
dois, um, dois, um, dois, três, quatro... Talvez se eu deitar no chão melhore a
respiração. Vi alguém falar isso. Abre os botões da camisa. Foi isso, foram os
bombeiros ou algum amigo meu. Devo ficar o mais próximo do chão... O ar está
entrando pela fresta da porta. Respira, vai Rafael, respira, inspira e
respira... Igual quando era criança e perdia o choro. Você não é menino, é um
homem agora. Cara, você tem trinta anos, toma vergonha nessa cara, para de ser
covarde e relaxa. Paga suas contas sozinho, ainda mora de aluguel... Mas tem um
carro importado e totalmente pago, quer dizer, ainda falta uma prestação. Puta
que pariu! Porra de consciência de merda. Queria ver o que um político faria
preso aqui! Possivelmente ficaria imaginando novos golpes contra nós, pobres
filhos da puta, e nem esquentava com a pane do elevador... Tudo da certo para
eles no final.
– Olha pra mim, Yang! (Pulando, gritando e tentando fitar a câmera o
mais próximo que podia) – Estou
preso, porra! (O elevador desce mais um andar e pára com bastante barulho) –
Meu deus, eu vou morrer, tenho certeza!
Meu deus, não me leve! Devo estar ainda no oitavo andar... Essa merda de marcador
de andar parou geral, não marca mais nada. O suor escorre pelo pescoço
inundando a camisa. Merda, merda, merda.
Foi sempre assim comigo, desde pequeno eu era sempre o mais lascado.
Tudo acontecia comigo... Quem se lascava nas brincadeiras? Eu. Quem caia da
bicicleta e quebrava os dentes? Eu. Empurrado do escorrego? Eu. Corredor
polonês? Porra, milhares de porrada na cabeça. Sempre eu! Mereço uma morte
assim, bem vagabunda, sozinho, dentro de um elevador, matéria de jornal de
quinta. Nessa vida só apanho! Comer a mamãe todo mundo quer, agora dar para o
papai nem pensar... No cu, pardal! Isso não pode estar acontecendo, estou
sonhando.
(Bate a cabeça na porta de metal várias vezes e o eco das pancadas
reverberam pelos corredores). – Meu deus, vou me lascar todinho nessa queda. Imagino a dor... Que
aflição! Esfrega as mãos pelo rosto repetidas vezes. Não Paizinho do Céu, não
me leve agora, eu tenho, eu tenho... Tenho nada, não adianta mentir para o
Senhor; eu não tenho ninguém para cuidar; sou eu e eu sozinho. Droga de vida,
eu sou sozinho; nem pai, nem mãe, nem um irmão para me irritar... Droga de
vida. Repete e fica estralando os dedos compulsivamente. Nem tia eu tenho.
Maldita orfandade! Também, criado em casa de abrigo de criança só da nisso. É
para se fuder mesmo. Quem mandou chegar até aqui? Nem namorada consegue. Cheio
de traumas e preconceitos, sempre vendo merda no olhar dos outros; defensiva
eterna. Porra, sansei, filho de uma
puta, onde está você? Yang, pelo amor de deus, me tira daqui... Te pago uma
piranha ou o que tu quiseres. Acorda filho da puta. Deve está vendo essa merda
de Big Brother.
– Será que ninguém está vendo isso? Que prédio escroto! Fica caminhando
em círculos. Vou fumar... Sei que vai piorar tudo, mas talvez seja melhor. Uma
boa ideia: a fumaça do cigarro saindo pelas frestas do elevador vai atrair
alguém. Claro que vai! Ou, quem sabe, ligar o alarme de fumaça e, então, estou
salvo... É isso! Santo cigarro! (acende um cigarro) – Nossa, que maravilha! (O elevador balança e desce
mais um andar em alta velocidade. Pára de supetão. Rafael se desespera mais
ainda; tenta abrir a porta, mas sem sucesso) – É o fim! Meu deus, que porra é isso? Estou todo mijado, nem consigo segurar
a onda. Meu deusinho, pelo amor de seu filho Jesus Cristo, me tire daqui! Olha
aqui, bem no meu olho! Eu prometo, prometo que, se eu sair dessa, deixo de
fumar! Juro pela minha alma. Olha aqui: (Mostra a carteira de cigarros aberta) –
Só tem três cigarros no maço, mas eu
prometo que, se sair, não fumo mais. Juro por deus, ou melhor, pelo senhor
mesmo né. Não adianta tentar lhe enganar dizendo que juro pelos meus pais
porque já morreram e tu sabes, afinal sabes tudo mesmo.
(O elevador ameaça novamente tremer e apagar as luzes.) – Pronto, era só o que faltava acontecer. Ficar no
escuro. Puta que pariu, que merda! (Uma fresta de luz passa pelo fundo da
porta.) – Caralho, caralho!
Desculpa-me os palavrões deus, pois sei que nessa situação estamos a sós. Vou
até confessar algumas coisas: eu roubei, realmente, o dinheiro do escritório
para a festa de confraternização de final de ano, inventei aquela mentira de
assalto e coisa e tal, fiz até boletim de ocorrência para dar mais veracidade,
lembra? Mas vou devolver tudo, tudinho. Trezentos e oitenta e cinco reais, mas
sem juros. Afinal o juro está tão baixinho não é? Estou sufocando... Porque
inventei de fumar? Droga, eu estou sem fôlego! Vai rolar pânico, novamente. Eu
quero sair daqui... (grita pelas frestas por baixo da porta.) Me ajude dona
Alzira do cafezinho... Ouça-me! (Agora,
deitado no piso do elevador com o ouvido esquerdo colado ao chão grita
desesperado.) – ESTOU PRESOO! Estou
preso! Ela houve sobre a vida de todo mundo, deve ser a única pessoa que está
acordada a essa hora e... Que horas são? Deixe-me ver no celular. Nossa, estou
viajando, mais de meia noite, dona Alzira deve está no terceiro sono. Droga, já
se passaram uns vinte minutos desde que entrei nesse elevador e continuo preso
aqui dentro!
Esse terno está me sufocando. Gravata vermelha com camisa branca e
terno azul marinho, tudo como todo mundo. Parecemos um bando de marionetes.
(Desdenha de si próprio, enquanto afrouxa a gravata.) – É a moda dos novos executivos de designer... Tem que acompanhar a galera
de sampa. Essas porras devem ter vindo de lá mesmo; foram compradas lá na rua vinte
e cinco de março, todas falsificadas. Mania deles de achar que ninguém entende.
Só porque tem cargo de chefia e manda em meia dúzia de pobres coitados ficam se
achando! Babaca, toda a diretoria deve rir de você pelas costas, Rafael.
Imbecil e, como todo filho da puta que conseguiu galgar um degrau a mais na
vida, ainda pisa na ralé.
Imbecil, imbecil! Agora está preso aqui e prestes a morrer numa queda
de sei lá quantos andares. Se transformando numa massa de sangue, ossos e
falsas grifes - kkkkkkk - Grande bosta tu fez da tua vida, otário! A única
coisa que vai ficar nesse mundo, lembrando sua inútil passagem, talvez seja uma
lápide em um cemitério, porque é bem capaz do médico legista, filho da puta,
vender o que sobrar do teu corpo para alguma faculdade de medicina. Nunca anda
com documentos; aprendeu isso desde pequeno para fugir de policia. Costume de
casa vai à praça; os documentos estão todos dentro do carro que está
estacionado a duas quadras daqui. Não consegui vaga no prédio... Agora é para
se fuder mesmo. Otário! Joga a gravata e o terno no chão do elevador.
(O elevador treme e apaga as luzes) – PORRA! Fudeu geral... Que escuridão! Não vejo nem meu dedo. Já sei: o
celular! Como não pensei nisso? O bendito celular. Vou tentar o celular. Meu deus,
porque não liguei para o meu amigo Bergh do escritório? Ou para o Max? Ou o
Robson? Oswalter, esse sim, está sempre com o celular ligado. Mas, e se eles
não estiverem a fim de atender? Tem disso também, às vezes o cara está em algum
rala e rola, dormindo, ou trabalhando feito o idiota aqui, vai olhar para o
visor do aparelho e dar de ombros. Eu faço isso, sempre! Droga de egoísmo
mundial. (Fica pulando e gritando dentro do elevador) – ESSE MUNDO TEM QUE ACABAR! Cala a boca idiota,
pois quem vai se acabar é você mesmo. Merda, merda, merda. Criatura burra
merece morrer mesmo. Deixe-me ver! Puta que pariu, ainda mais essa: não tem
rede!
– CARALHO! LEVA-ME, DEUS! LEVA-ME LOGO, FAZ ESSA MERDA, AFUNDA LOGO DE
POÇO ADENTRO! Desculpe-me deus, desculpe-me. E, como diria seu filho, eu não
sei o que falo, na verdade, eu nunca soube. E agora? O que faço? Cantar! É
isso! Vou cantar alguma coisa para passar o tempo. Caetano? Não sei nenhuma
letra inteira dele, apesar de "Oração ao Tempo" ser a minha
preferida, ela é perfeita. Mas, que tempo? Rir de si mesmo. O seu está
acabando, imbecil! Chico? Qual dos dois? O Buarque ou o Cesar? Tem graça eu
ficar gritando aqui mama áfrica rodando de pernas abertas em círculos. (Dar uma
gargalhada) – Esse clipe do Chico
Cesar é hilário! Ele correndo no meio da praça de um interior do nordeste com
uma multidão, e quase derruba uma menina, que se afasta do cantor com um olhar
de ódio. Bizarro demais cara! Bizarro! Não sei quase nada de letras de músicas.
Fagner? Ele tem uma que eu sei, e é mais ou menos assim: “Teu amor é cebola
cortada meu bem que eu gosto de... de...” – Esqueci! Que merda, esqueci a letra. Deixe-me ver outra: “Você é luz,
é raio, estrela e luar, é luz do sol, meu Iaiá meu ioiô, manhã de sol... Manhã
de sol...” – Droga Wando, nem tu que
tá perto pertinho do homem me ajuda!
– Deus, eu prometo... Juro por tu mesmo que, quando sair daqui, vou ser
uma nova pessoa, me organizarei financeiramente e criarei uma ONG para tirar
crianças da rua. Vou fazer isso mesmo. Meu Deus... ESTÁ ACABANDO A BATERIA DO
CELULAR! Japonês filho de uma puta de olho cerrado acorda! Se eu sair daqui,
Yang, vou acabar com a tua raça. Está vindo um ataque de asma... Eu sei quando
vem; faz mais de quinze anos que eu tive o último ataque; foi uma grande merda.
Lembro que começou por fingimento. Eu estava tentando fugir daquele padre safado,
o pedófilo do orfanato, que ficava passando a mão nas nossas coisas; eu o
odiava. Quando ele aparecia eu tinha até ânsia de vômito. Rezava todas as
noites para Deus o matar, e foi daí que veio os meus questionamentos divinos.
Como pode deixar um escroto daquele ficar cuidando de crianças? Haviam alguns
meninos que gostavam, eu sei, também era tudo viado. (Treme o elevador) –
Mas, por mim, pouco importa. Vou até
sentar no chão e esperar a queda; pode cair de vez, já estou me confessando
mesmo, só falta agora encarar o chefão. Pois é, quando aquele urubu nojento
aparecia durante as madrugadas nas nossas camas eu era o único que o repelia.
Muitas vezes fiquei sem comer; ele me castigava pela manhã dizendo que eu
precisava jejuar; dizia que eu estava cheio de pecado; e tudo isso porque eu o
repelia. Só fiquei feliz no dia em que as minhas preces foram ouvidas. Obrigado
Pai. A bichona quebrou o pescoço caindo da escada, depois de rezar á missa do
domingo. Durante o velório enquanto todo mundo chorava, eu dava gargalhadas por
dentro. Ri tanto que comecei a me engasgar na cerimônia; todos olhavam para mim
me recriminando, mas eu não conseguia parar. Fingi que estava tendo um ataque
de asma... E não é que o ataque aconteceu mesmo? Foi um dos piores momentos da
minha vida. O fôlego limitado, quase acabando, o peito doendo e limitando minha
respiração... Foi terrível. Não, não adianta! Não vou ter um ataque de asma
aqui... Não Papai do Céu, pelo amor de Deus, não permita!
(Durante alguns segundo começa a ter um ataque de asma, depois se
acalma chorando) – Para que
isso, meu Deus? Para que isso? Quer me castigar? Já não basta pânico, asma,
escuro, elevador despencando e ainda quer que eu acredite em inferno?
Socorro... Socorro... Yang? Dona Alzira? Estou enlouquecendo aqui! (Acende
outro cigarro.) – Eu prometo, deus,
esse é o último; vou até jogar e rasgar esse único que ainda está nesse maço.
(Pega o maço meio amassado, rasga o cigarro em pedaços, esmaga com o pé e,
assobiando, joga o maço vazio e amassado no canto do elevador) Observa que a
mancha de urina evaporou. Passa a mão na braguilha e leva-a ao nariz. (Um
cheiro forte de urina entra pelas suas narinas.) – Que droga, minha calça só fede a urina. Pronto,
agora só tem esse que estou fumando. Eu juro que, se me tirares daqui,
cumprirei essa promessa, pelo menos essa! Eu juro! Sei que minha vida é
totalmente sem rumo, nem sei quem eu sou e para onde irei. Só sei que vou!
Contudo, deus, ninguém me ensinou a caminhar. A vida sempre me fez correr. Vivo
correndo sempre, atrás de nem sei o que... Só sei que corro sempre. Às vezes
até paro um pouco. Sou tão viciado nessa corrida que nem meu próprio pensamento
me acompanha, e corro por algo que nem imagino.
(Joga o final do cigarro fora, começa a cantar um trecho de uma música
natalina.) – Nem sei por que
estou cantando isso. Odeio essa música e palhaços! Como odeio palhaços! Acho
que eles estão sempre rindo da desgraça da gente com aquelas máscaras idiotas.
É tudo pura sedução pra vender algo, eles cobram as risadas sabiam, já parou
pra pensar que você paga pra rir no circo? E muitas vezes bem caro, tem o
lanche, tem estacionamento, meu deus quanta bobagem estou falando novamente.
(As luzes acendem e as portas do elevador se abrem no andar térreo. Rafael
levanta de um salto do chão feito uma mola. Apanha o terno do chão; passa da
metade da porta, olha pra cima, tira de outro bolso uma nova carteira de
cigarros; olha-a; olha para a câmera, abre a carteira e tira um cigarro; em
seguida dar de ombros e acendendo-o fala) – Obrigado, Pai! Obrigado por tudo, mas...
(Levanta o cigarro aceso para o alto, a fumaça segue em direção ao
alto, olha novamente para a câmera e, segurando a porta aberta com o corpo já
quase totalmente fora do elevador, dá um salto para fora e fala) – A carne é fraca! (Dar uma forte tragada e joga a
fumaça para o alto.) – Valeu
amigo!
FIM
Revisor: Professor
Gilberto Costa-UFRN
Natal/RN, 31 de
março de 2012
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